Ela, em sua totalidade, nunca é plena.
Precisa sim, ser conquistada e merecida diariamente.
Somos reproduções ensaístas de nosso tempo. Transitamos de forma presunçosa e pretensiosa num universo efêmero, intransigente e premente. Suponho que gostemos disso ou da forma apresentada e revelada e também por compreendermos esse universo circundante como conhecido, presumido e oferecido sem esforço algum e com absoluta falta de estilo.
Somos filhos da rede social, da conectividade, da interatividade. Descansamos entre bits, vivemos conectados e atrelados por e-mails. Spams possuem reinado absoluto e somos consumidos pela guerra info overload, Nossas vidas são representadas, estampadas e parecemos prescindir igualmente de individualidade em detrimento ao absurdo coletivo. Uma histeria midiática, volátil e impassível. Um império efêmero e implacável.
Abrimos antecedentes para consumir e consumar o que somos, pensamos e sentimos. Uniformizamos tudo, liquidificamos. Pasteurizamos as relações humanas. Parecemos prescindir de memória pregressa. Limitamos essas relações aos perfis que idealizamos e que fingimos. Sucumbimos ao paraíso artificial que acontece dentro e fora de nós. Rápido, implacável, intransigente, intolerante e desejosamente fugaz.
Insistimos em delegar a mídia e seus estereótipos uma “falsa” consciência e ordem dos acontecimentos de nosso tempo. Uma asfixia estudada e imbecilizada dos programas de TV, da retórica e supressão dos realities shows – nossa vida cuspida, escarrada e violentada bem na frente dos nossos olhos. Metálicas emoções e indiferentes consciências engordando a lista de vidiotas catatônicos e desbussolados de plantão.
Ameaçadora, a mídia e seus segmentos parecem orbitar nossa geração, todavia tamanha diabolização não reúne em si uma única e espiada culpa. Faço uso agora, das palavras do rtfilósofo francês, Gilles Lipovetsky, em seu livro Metamorfoses da Cultura Liberal , para que possamos abrir e estabelecer um viés para tal compreensão:
(...) A mídia, de fato, é uma das forças subentendidas na formidável dinâmica de individualização dos modos de vida e dos comportamentos da nossa época. A imprensa, o cinema, a publicidade e a televisão disseminaram no corpo social as normas da felicidade e do consumo privados, da liberdade individual, do lazer e das viagens e do prazer erótico: a realização íntima e a satisfação individual tornaram-se ideais de massa exaustivamente valorizados. Ao sacralizar o direito à autonomia individual, promovendo uma cultura relacional, celebrando o amor pelo corpo, os prazeres e o bem-estar privados, a mídia funcionou como agente de dissolução da força das tradições e das barreiras de classe, das morais rigoristas e das grandes ideologias políticas. Impôs-se como nova e legítima norma majoritária o viver aqui e agora, conforme as vontades próprias. A mídia acionou, ao mesmo tempo que os “objetos”, uma dinâmica de emancipação dos indivíduos em relação às autoridades institucionalizadas e às coerções identitárias.
Cabe a nós reinventar a vida a partir dessas constatações, cabe igualmente a utilização de filtros que nos permitam, com clareza, percebermos o Norte que os espíritos de influência midiática e virtual encerram em nossas vidas. O Inconformismo e o espírito crítico, a priori, devem estabelecer uma relação saudável de consciência e questionamento e por fim, emancipar-nos de ideologias capazes de nos instrumentarem para enxergarmos com clareza a linha tênue que separa a verdade de sua pretensa e famigerada constatação. Almas esfomeadas e reincidentes no crime de acreditar. Voilá!!!
Gilbert Antonio
* artigo publicado na revista digital Manuscrita: Confira www.manuscrita.com.br