A mescla inexorável que as novas relações familiares se constituem, desbancam a tradicional instituição, as quais, fadadas aos modelos tradicionais, prescindiam e prescindem de um novo núcleo etimológico e comportamental.
Viver uma relação familiar como base nos modelos anteriores, difundidos e preconizados pela cultura vigente e rançosa é tornar falível as relações humanas pré/pós-existentes na nova ordem das constituições familiares contemporâneas. Presumir ou insistir que oferecemos material emocional segundo os modelos e exemplos até então vigentes, é igualmente confirmar o fracasso e insucesso das relações consistentemente arraigadas aos parâmetros iniciais.
Existe aquilo que os psiquiatras pontuam de Teoria do Verdadeiro Dilema da Paternidade e da Maternidade, segundo a qual, por mais que os pais devotem sua vida aos filhos, os resultados sempre fogem ao seu controle. Corrobora-se aqui que, modelos e registros, até então defendidos e ou preconizados, não determinam ou tampouco contribuem na formação desse núcleo.
Os núcleos familiares estão recebendo novas constituições de família. Representam em si e socialmente as novas formas ou nem tão novas assim, dessas formações. Famílias que possuem em suas respectivas formações pais homossexuais, bissexuais e atualmente, as famílias formadas pelo poliamor, engrossam as novas e necessárias discussões sobre os arquétipos da sistêmica familiar.
Passamos a conviver com novos e pouco ortodoxos modelos dessa diversidade. Cultivam-se as relações dessa pluralidade através do prazer, satisfação e ordem social. Abre-se mão do gênero o qual essas relações eram constituídas e dá início ao estabelecimento da nova ordem dessas relações. Integra-se aqui, os filhos, que depois de adultos, retornam à casa dos pais para retomar tal sistêmica.
Segundo Judith Viorst, os mitos familiares contribuem para estabilizar a estrutura organizacional. Conservam a unidade emocional. E são apaixonadamente defendidos por todos os membros da família. Mas muitos deles são distorções da realidade, às vezes grotescas e prejudiciais. Representam-se aqui as dificuldades inerentes e pertinentes dos novos núcleos. O universo interno onde essas relações se estabelecem entram em choque com os focos tradicionais e vigentes de famílias tradicionais e seus mitos.
Para manter um determinado mito, diz o especialista em dinâmica familiar Antonio Ferreira, pode ser necessária “uma certa dose de percepção”. Como perceber-se e integrar-se a esse núcleo determinará em parte, a qualidade das relações constituídas na dinâmica familiar.
Judith Viorst pontua que, um dos mais problemáticos desses mitos, ou temas, é o mito da família unida e harmoniosa, que pode acarretar uma negação desesperada de qualquer dissenção ou distanciamento entre os membros da unidade familiar.
Somos filhos de uma geração que anseia pelo amor e aprovação do outro, em outras palavras, não queremos ser rejeitados. Advêm do mito de família unida e harmoniosa, o desespero e angústia em viver segundo as idealizações e projeções feitas para que possamos ser mais e melhor amados.
Viver em família ou em núcleos constituídos como tal, demanda um estudo dos pais que o sistema mitológico da família impõe a cada um. Inconsciente ou conscientemente estamos atrelados aos papéis. Estamos em constante vigília e patrulhamos o objeto de nosso amor. Ainda ressentimos a dúvida ou a constatação de que somos amados de formas diferentes e que há os escolhidos e igualmente os eleitos.
Essas evidências pressupõem um repensar na qualidade dessas relações constituídas; sugerem o impacto das mesmas em nossas respectivas histórias pessoais. Sabemos que uma vez constituída m família e suas ilhas de conforto e interesse jamais seremos os mesmos. Somos tocados para sempre, independentemente de ser de forma boa ou ruim. Tais constatações são factíveis e inevitáveis.
“Nossa experiência subjetiva da vida e nosso comportamento”, escreve o psicanalista Roger Gould, “são governados literalmente por milhares de crenças (ideias) que compõem um mapa, usado para interpretar os acontecimentos da nossa vida (inclusive nossos problemas particulares). Quando crescemos, corrigimos uma convicção que nos restringiu e nos limitou desnecessariamente. Por exemplo, quando aprendemos na juventude que nenhuma lei universal nos obriga a ser o que nossos pais queriam que fôssemos, estamos livres para explorar novas experiências. Abre-se uma porta para um novo nível de consciência...”
Os novos núcleos familiares nos são apresentados e revelam em si um exercício de profunda experiência. Cabe a nós apreender através da diversidade e sazonalidade com que os mesmos acontecem. Cabe igualmente uma ampliação e flexibilidade do amor e seu resgate. Viver tal experiência ultrapassa todo e qualquer entendimento. Transcende até mesmo a forma, o conceito. Permite-nos viver a transcendência do gênero, do modelo, da definição e de regra. A perseguição pela felicidade e respeito à individualidade pode ser obtida na convivência e prática de liberdades respeitadas e valorizadas.
“Imergir para emergir, pode ser parte do processo fundamental do crescimento psicológico”, pode ser igualmente o sonho bom que não queremos acordar e pode ser o caminho de volta para casa, onde as inomináveis definições que demos podem, pura e simplesmente serem chamadas de família – minha doce e segura zona de conforto.
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